Cássio Krupinsk
Com o surgimento das criptomoedas, não somente o mundo financeiro começou a transformar seu olhar sobre o dinheiro, como também as esferas políticas. Afinal, como poderia ser diferente? A simples ideia de uma moeda que não existe fisicamente, cujas transações residem apenas no mundo virtual, implica consequências, no mínimo, revolucionárias.
Após adesão dos Estados Unidos, da China, da Índia, da Rússia e do Reino Unido, o Banco Central do Brasil anunciou este mês o início do projeto-piloto do Real Digital. Com o aumento dos pagamentos eletrônicos, o uso do papel-moeda em queda, entre outros motivos, o BC enxerga com bons olhos uma moeda brasileira à la stable coin .
Seguindo a tendência internacional, o país entra em uma nova fase de digitalização financeira, intensificando ainda mais a diminuição das transações em papel-moeda – que representam atualmente apenas 3% das operações.
O objetivo do governo é que o novo dinheiro seja usado em pagamentos, compras, transações e investimentos. O Real Virtual terá duas versões. Para o atacado, será utilizado em pagamentos entre o Banco Central e as instituições financeiras. Já a versão do varejo será emitida pelo mercado e chegará ao consumidor final em formato de um real tokenizado. Ou seja, é uma representação digital do dinheiro já usado. Assim como em contas bancárias, poderá ser trocado ou armazenado eletronicamente.
Mas quais as vantagens desse novo modelo? Primeiramente, remove o custo de pagamentos de 2% e torna possível um pagamento ínfimo para apoiar a economia de dados. Aumenta muito a liquidez, já que toda a complexidade em câmbio, o cross-border e a reconciliação pós-negociação são eliminados. Qualquer coisa pode ser trocada em novos mercados digitais com controle do proprietário dos dados sobre identidade, propriedade e regras de mercado (votação), tudo com finanças descentralizadas.
Além disso, a moeda permite transações entre pessoas de forma direta; reduz custos de produção, armazenamento, transporte e distribuição de dinheiro físico; traz acesso à população não bancarizada; estimula a inovação no setor financeiro, impulsionando o desenvolvimento de novas tecnologias e soluções; e ainda pode ser usada em qualquer lugar do mundo, sem necessidade da conversão por meio de bancos.
O projeto-piloto já está no radar de empresas e instituições financeiras e o lançamento para a população está previsto para o fim de 2024.
O desafio agora é garantir a descentralização, velocidade, veracidade e imutabilidade de dados para diminuir custos e favorecer mais eficiência, sem intermediários nos processos financeiros. O truque é regular os fundos de reserva onde o CBDC no atacado pode ser uma garantia útil.
O futuro do valor digital é o que chamamos de tokenomics, aliado a um novo tipo de banco digital. Assim como a Amazon era uma nova espécie de livraria. Ainda é possível comprar um livro em uma loja, mas hoje ninguém pode imaginar a ausência do comércio eletrônico. O dinheiro programável é inevitável. A sociedade precisa de um novo modelo digital para a democracia, ou abriremos mão de nossos direitos digitais por falta de apetite para assumir qualquer responsabilidade ou deveres virtuais, por exemplo, sob custódia.
Concordo, no entanto, que qualquer ferramenta pode ser usada para o bem ou para o mal. É justamente o processo democrático que importa para tomar essa decisão. O fato é que a economia token está nascendo, mas poucas pessoas têm esse nível de compreensão. A descentralização é uma guerra pela democracia na economia, na política e na filosofia. A blockchain é uma máquina de mudança de comportamento por meio da liberdade das transações. Sempre houve luta pela democracia. Agora esse é o campo de batalha dessa geração.
Cássio Krupinsk, CEO da BLOCKBR, fintech especializada em infraestrutura de tokenização e investimentos em ativos digitais