Ao identificar um uso problemático do smartphone, existem maneiras de lidar com a situação, como estabelecer pausas tecnológicas ao longo do dia.
Você está lendo isso no seu smartphone enquanto responde mensagens no chat, confere manchetes, responde seu chefe, joga Wordle e verifica como seu post no Instagram está sendo recebido, tudo isso antes de guardar o telefone no bolso apenas para tocá-lo reflexivamente e garantir que ele ainda está lá? Se sim, você não está sozinho. Contudo, isso pode indicar um relacionamento problemático com seu dispositivo, algo que, segundo especialistas, é compreensível.
“É difícil resistir à tentação de pegá-lo e desbloqueá-lo”, diz Gloria Mark, professora e chanceler de informática na Universidade da Califórnia, Irvine, que estuda o impacto da mídia digital na vida das pessoas. “Muitas vezes, não há uma razão clara para isso; é um hábito.” Esse hábito, porém, pode cruzar uma linha perigosa.
Pesquisadores desenvolveram formas de medir o que tem sido chamado de vício em smartphones, como a Escala de Vício em Smartphone (SAS) de 2013, baseada no Teste de Vício na Internet. Em 2023, a Universidade de Toronto usou o SAS para conduzir o maior estudo sobre vício em smartphones até hoje, com mais de 50 mil participantes de 18 a 90 anos em 195 países. O estudo descobriu que mulheres e jovens eram mais propensos ao vício, especialmente em países do Sudeste Asiático. “As pessoas tentam evitar emoções negativas usando o telefone, como uma chupeta para adultos”, afirmou Jay Olson, pesquisador líder do estudo.
Mas será que podemos chamar isso de “vício”? Gloria Mark e outros especialistas evitam o termo. “Eu seria cautelosa ao usar a palavra ‘vício'”, diz Gloria, autora do livro “Attention Span”. Segundo ela, vício é quando o uso interfere profundamente na vida da pessoa, como impossibilitar o trabalho.
Pesquisadores em Barcelona também questionaram o uso do termo em um estudo de 2018, sugerindo que o comportamento excessivo com smartphones deve ser chamado de “uso problemático”, e não de vício. Larry Rosen, professor emérito de psicologia na California State University, Dominguez Hills, e especialista em psicologia da tecnologia, concorda. “Quando usamos esse termo, tudo começa a ser classificado como vício, o que ainda não é”, especialmente segundo o DSM-5, manual de diagnóstico psiquiátrico, que classifica o transtorno de jogo na internet (IGD) como uma condição semelhante.
Rosen explica que o uso problemático de smartphones pode seguir duas direções: uma necessidade crescente de usar o telefone, em busca de “ondas” de dopamina e serotonina, ou uma obsessão baseada em ansiedade, como a necessidade constante de checar a reação das pessoas a um post no TikTok, causando uma descarga de cortisol.
Outro termo relevante é “nomofobia”, a fobia de não ter o celular por perto, que pode incluir sintomas como sentir vibrações fantasmas no bolso. Rosen enfatiza que isso é diferente de um vício químico, que envolve a necessidade de mais substâncias para atingir o mesmo efeito.
Como saber se você tem um problema com o smartphone? Depende de como você mede. Se usar as diretrizes do IGD, observe sintomas como preocupação excessiva, sentimentos desagradáveis ao ficar sem o telefone, necessidade crescente de uso, dificuldade em controlar o uso e consequências negativas. A Escala de Vício em Smartphone apresenta 11 afirmações para autoavaliação, como “sou viciado em meu smartphone” e “tenho dificuldade de me concentrar no trabalho devido ao uso de smartphone”. Há também critérios diagnósticos propostos em 2016, que incluem 16 indicadores, como preocupação com o uso, falha em resistir ao smartphone e perda de interesses anteriores.
Gloria Mark adota uma abordagem mais simples: “Torna-se um problema quando você não consegue fazer as coisas que deveria estar fazendo, como trabalhar ou manter uma conversa sem a interferência do telefone”, afirma. “E também quando você não consegue parar esses comportamentos, apesar dos problemas que causam.”
Para lidar com a dependência de smartphones, Rosen sugere começar aumentando a autoconsciência. Verifique o tempo de tela e anote-o, cronometrando pausas tecnológicas para usar o telefone de forma controlada, aumentando gradualmente o tempo entre as pausas. Gloria sugere deixar o telefone em outro cômodo ou em uma gaveta, especialmente durante o trabalho, para dificultar o acesso e, assim, reduzir o uso.
Rosen também alerta contra o uso de caixas trancadas com temporizador, como as sugeridas no documentário “The Social Dilemma”, por causarem distrações e ansiedade. Ele desaconselha o uso do telefone como forma de punição, pois isso pode causar birras e aumentar a ansiedade. Gloria também não é a favor dessas caixas, preferindo que as pessoas desenvolvam seu próprio senso de controle para administrar seu comportamento de forma eficaz.